5 de abril de 2013

Falta de sanitários nas estações, buracos na pista, insatisfação de motoristas e ausência de  ônibus expressos aos domingos são algumas das  queixas dos usuários que utilizam o sistema implantado para os Jogos Olímpicos de 2016

Natasha Sousa Dias e Jackeline Granadeiro Chagas

O BRT Transoeste, inaugurado no dia 6 de junho de 2012, é uma das principais bandeiras da gestão do prefeito do Rio Eduardo Paes. A via faz a conexão entre os bairros de Campo Grande/ Santa Cruz e o terminal Alvorada, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio. O sistema tem capacidade para transportar até 220 mil passageiros por dia e foi criado com o intuito de trazer conforto aos passageiros, reduzir o tempo de espera e o tempo de viagem e revitalizar vias e acessos. Assim como a Transoeste, outros dois corredores viários – a Transolímpica e a Transcarioca –  fazem parte do pacote de obras para a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016. 

O professor do Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal Fluminense (UFF) Levi Salvi explica que não existem muitas opções de transporte coletivo para áreas urbanas já instaladas. Para ele, o sistema metroviário costuma dar os melhores resultados, mas pesam o custo alto de investimento e o tempo necessário para a obra. “Acredito que o BRT foi a melhor opção considerando a relação custo x benefício. O BRT, se bem implantado e bem administrado, proporciona ótimos resultados, como é o caso da implantação do BRT de Curitiba, copiado em vários países do mundo”.

Entretanto, pouco mais de seis meses depois de sua inauguração, o sistema apresenta alguns problemas de gestão e os motoristas do “Ligeirão” se mostram insatisfeitos com as condições de trabalho. "Aqui a gente está sendo tratado igual a um cachorro", disse um motorista, que não quis se identificar. Segundo eles, as estações não têm banheiro nem lugar apropriado para que eles possam lavar as mãos. Afirmam também que quem cumpre horário no turno da tarde trabalha cerca de dez a 11 horas por dia, diferente do turno da manhã, que tem uma carga horária menor. Caso eles não queiram trabalhar as horas extras, ficam suspensos no dia seguinte e na folga, ou seja, os dois dias são descontados do salário. Além disso, ainda segundo os motoristas, não há horário de almoço e, em dias de muito calor, o ar-condicionado não dá vazão. Eles reivindicam ainda uma cabine dentro dos coletivos de modo a separá-los dos passageiros. "É muito desgastante ter que dirigir quase 11 horas por dia e ainda ter que ficar ouvindo falatório. Isso quando o passageiro não fica reclamando no nosso ouvido. Isso é estressante. Chego em casa esgotado", disse outro motorista, que também pediu para não ser identificado. 

Segundo o site Cidade Olímpica, os investimentos nos trechos construídos do Transoeste (Barra - Campo Grande/ Santa Cruz) já chegam a R$ 933 milhões, entre obras viárias, desapropriações, construção e montagem de 53 estações. O custo médio de cada estação está estimado em cerca de R$ 1 milhão. A obra inclui a restauração de 255 mil metros quadrados de pavimentação, a implantação de mais de 522 mil metros de asfalto e uma nova iluminação, com 3.650 pontos de luz. A abertura do Túnel da Grota Funda, que tem duas galerias de 1.100 metros,  custou cerca de R$ 549 milhões. Os túneis foram abertos utilizando o mesmo método usado na Linha Amarela, perfurando e explodindo. Os gastos até 2016 devem chegar a R$ 1 bilhão com a expansão do Transoeste. A prefeitura pretende ampliar o corredor para levar o BRT do Terminal Alvorada até a estação Jardim Oceânico do metrô, prevista para ser inaugurado às vésperas das Olimpíadas.

A Estação Alvorada é ponto de partida e chegada de usuários que utilizam o sistema BRT (foto de Natasha Dias)

A Zona Oeste tem cerca de 1,64 milhão de habitantes – é quase uma cidade dentro da cidade do Rio de janeiro. As opiniões dos passageiros se dividem quanto ao serviço prestado pelo BRT. "O BRT facilitou muito a vida do trabalhador. Antigamente os ônibus demoravam demais. Antes tinha que pegar o 460S (Barra da Tijuca x Itaguaí), que custava R$ 4,60. Ele passava de duas em duas horas e ainda subia a Serra", afirma a auxiliar operacional Fernanda Gama dos Santos, 37, moradora de Santa Cruz,  Já para o pedreiro Eduardo Costa, 43 anos e morador de Santa cruz, que pega o BRT sempre em horário de rush, "o Ligeirão é bem rápido, mas no horário de rush ele fica muito cheio. Entre 6h e 8h da manhã, a gente tem que ir imprensado. Na volta ainda é pior porque está todo mundo cansado depois de um dia de trabalho e o ônibus cheio. Está até parecendo metrô". 

Tal como os motoristas, os passageiros também reclamaram da falta de banheiro nas estações. "Se qualquer pessoa quiser ir ao banheiro e já estiver aqui dento, ela tem que sair e procurar algum estabelecimento com banheiro. Ao voltar ainda tem que pagar outra passagem para entrar", afirmou a vendedora Ana Lúcia de Souza, 43, moradora de Paciência. A ambulante Roberta Gazoni, 31, também manifestou sua insatisfação. “Já tive que pagar passagem duas vezes. Já na estação, tive vontade de usar o banheiro, fui obrigada a sair para procurar algum estabelecimento e na volta tive que pagar a passagem novamente para entrar”, criticou a camelô.

Trajeto Alvorada x Pingo D'água 

A linha tem 28 estações, mas três delas ainda não funcionam: Golfe Olímpico, Recanto das Garças e Dom Bosco. O trajeto dura cerca de 50 minutos e, no horário de rush, os ônibus articulados saem a cada 6 minutos. As linhas alimentadoras facilitam o acesso dos passageiros de forma que eles possam pegar a linha troncal (principal). São oito linhas alimentadoras, sendo uma na estação Pingo D'água, duas na Magarça, três na Mato Alto, uma na Ilha de Guaratiba e uma no Terminal Alvorada. O terminal Santa cruz e a estação Santa Eugênia têm acesso ao trem. A estação Alvorada, na Barra da Tijuca, onde o BRT inicia seu trajeto, costuma ficar sempre cheia, mas como o intervalo entre os ônibus articulados é pequeno, as filas diminuem de tamanho rapidamente. Entre uma parada e outra, o “Ligeirão” lota e esvazia. Isso acontece, por exemplo, na estação Benvindo de Moraes, 15° após a Alvorada, onde havia apenas três pessoas em pé. Porém, ao chegar na estação do Recreio Shopping, 19° após o Alvorada, o ônibus lotou. 

O asfalto apresenta desgaste, o que obriga o motorista a reduzir a velocidade a cada buraco ou imperfeição na pista. Em alguns trechos, é possível perceber que o asfalto vermelho que cobre a via – uma mistura asfáltica colorida para tráfego intenso e pesado, também utilizada em outros países como França, Japão, Austrália e Inglaterra – está desbotado, como nas proximidades da estação Ilha de Guaratiba, onde a pista não estava boa. Na estação de integração Mato Alto, 27° após o Alvorada, o “Ligeirão” teve que sair da via expressa e passar para a pista dos carros devido a uma obra que deixou a via interditada até a estação Pingo D'água, a última do trajeto que começou na estação Alvorada. 

No caminho de volta, próximo à estação Embrapa, um pedaço grande de madeira na pista quebrou quando o ônibus passou por cima. Um barulho muito alto assustou os passageiros. O motorista teve que descer para tirar a madeira da pista e não atrapalhar a viagem de outros coletivos. 

Durante a madrugada e no domingo o intervalo entre a saída dos ônibus ultrapassa 30 minutos. O serviço expresso funciona de segunda a sábado, entre 5h da manhã e 1h da madrugada do dia seguinte. Já o serviço parador funciona 24h. "O ruim é de madrugada. As filas ficam grandes e quase não tem ônibus. A gente tem que ficar um tempão esperando. Meu marido trabalha longe e pega cedo no trabalho. Ele sai de casa às 4h", destacou a gerente Angélica Araújo, 27 anos.

Usuários reclamam da lotação do ônibus em horário de rush: "A gente tem que ir imprensado" (foto de Jackeline Chagas)
Até Santa Cruz, mais problemas
Joel Carlos, 41 anos, reclamou da falta de ônibus expressos aos domingos. “Normalmente, eu demoro 50 minutos para chegar no trabalho, mas aos domingos pega esse tempo e multiplica por 20. Peguei, no domingo, o BRT em Santa Cruz para nunca mais. O 853 (Campo Grande - Barra da Tijuca) é muito mais rápido”, afirmou. Ele, que trabalha como segurança, contou que seus colegas de profissão são obrigados a sair mais cedo de casa aos domingos pela falta de opções de transporte público. Os ônibus articulados expressos não funcionam aos domingos.
Na fila, os passageiros queixaram-se da demora dos ônibus. A diarista Regina das Graças, 46, disse que já esperou de 25 a 30 minutos para embarcar. “Tem dias que é rápido, mas já esperei de 25 a 30 minutos para conseguir embarcar. Isso é um absurdo”, reclamou.
O tempo de espera da equipe ao entrar na estação e embarcar foi de cinco minutos. Saímos de Santa Cruz rumo à Alvorada. No decorrer do percurso, o ônibus foi ficando cada vez mais cheio e as trepidações, devido aos buracos, foram diminuindo à medida que o coletivo se aproximava da estação Alvorada. As trepidações eram mais constantes no trecho Santa Cruz - Ilha de Guaratiba. Chegando à estação Alvorada, onde o engarrafamento fica mais intenso, o BRT passa livremente sem transtornos ao local de destino. 
No trecho após a Grota Funda, sentido Santa Cruz, foi possível observar que ainda há muitas áreas verdes, sem urbanização. Sobre as influências que a chegada do BRT poderia gerar nessa região, Levi Salvi Levi, professor do Departamento de Engenharia Civil da UFF, afirma que o sistema BRT, por si só, não determina como será o processo de urbanização e ocupação de áreas. “Quem determina isso é o Plano Diretor, que estabelece as diretrizes para a ocupação do município. Se o Plano Diretor for cumprido adequadamente, o BRT não terá influência negativa nestas regiões”, avaliou o professor.

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