5 de julho de 2012
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Márcio Castilho

A implantação de uma série de dispositivos por parte de órgãos de fomento vem criando uma lógica de isolamento entre os pesquisadores, enfraquecendo, ao mesmo tempo, espaços de discussão e de solidariedade entre os docentes em programas de pós-graduação. Uma pesquisa dos professores Décio Rocha e Bruno Deusdará, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), mostra que os critérios têm caráter prescritivo, ou seja, influenciam as formas de atuação acadêmica, com pontuações diferenciadas para cada tipo de atividade exercida e indicações até mesmo sobre como proceder para que um artigo científico seja considerado “publicável”.

Alguns resultados da pesquisa, trazendo a configuração – reforçada em editais de financiamento – de um perfil profissional ideal, foram apresentados na palestra “O discurso produtivista e o trabalho docente em programas de pós-graduação stricto sensu”, dia 27 de junho, na sala 100 do Iacs. O evento, incorporado ao calendário das atividades de greve do curso de Comunicação Social da UFF, teve participação menor de alunos em relação aos encontros anteriores.

Valorização da hierarquia


A análise dos professores da Uerj sobre os critérios que orientam a produção do pesquisador foi baseada em 13 de um total de 46 documentos de avaliação trienal da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) referentes ao período 2007-2009. Os autores relacionaram algumas exigências do órgão para avaliação do docente na área da pesquisa, tais como quantidade de orientações de teses e dissertações, emissão de pareceres, participação em conselho editorial de periódicos, bancas de concurso e conferências, publicação de artigos e organização de eventos, dentre outras funções. O trabalho demonstra que tais prescrições são verticalizadas e priorizam a hierarquia.

“Um livro produzido por alunos de doutorado ficaria com pontuação menor, pois, nessa lógica, não teria a mesma qualidade de um livro produzido por docentes”, ilustra Décio, criticando também a falta de estímulo à criação de coletivos de trabalho. “Os investimentos são todos individuais, nunca coletivos. Não há um dispositivo que incentive a solidariedade na pesquisa. Em todos eles, a produção do isolamento é solicitada”.

Critérios quantitativos


Os pesquisadores questionam o caráter quantitativo na produção docente em programas de pós-graduação, fazendo do professor um mero executor de tarefas em prejuízo a sua autonomia intelectual. Ao fazer essa crítica, eles procuram deixar clara a separação entre produtivismo e produtividade.

“Quando se questiona produtivismo”, argumenta Bruno Deusdará, “associa-se essa crítica à improdutividade, como se aqueles que criticam o produtivismo fossem improdutivos. Esse discurso está carregado de produção de sentido. Cola produtividade com produtivismo. A partir dessa lógica binária, qualquer luta já nasce desqualificada”.

‘Pós-graduação não faz greve’


O embate entre o individual e o social, com preponderância para o primeiro no contexto atual, acaba se refletindo em períodos de greve de professores. Esse ponto também foi abordado pelos autores da pesquisa. Eles procuraram relativizar o discurso “pós-graduação não faz greve”, presente no senso comum do ambiente acadêmico. Os argumentos, segundo a pesquisa, seriam as especificidades do trabalho na pós, os prazos inadiáveis dos órgãos de fomento e as coerções decorrentes dos convênios firmados com outras instituições. Como observa Décio, “isso nunca foi debatido, mas é sempre repetido”. Uma das consequências é o distanciamento do pesquisador em relação às lutas da categoria, envolvendo participação na vida sindical.

Para combater o individualismo


A apresentação dos pesquisadores da Uerj foi pontuada por debates entre professores e alunos de pós-graduação e graduação de diferentes instituições de ensino. A professora Andréa Vale, pós-doutora em Políticas Públicas e Formação Humana, que atuou como palestrante na primeira atividade de greve do Iacs, ressaltou que a lógica do produtivismo e do isolamento resulta num debate importante acerca do financiamento das instituições públicas de ensino superior. Ela alertou para o problema de a captação de verbas nas universidades ser feita individualmente, via bolsas de produtividade, em substituição ao financiamento público.

O professor José Antônio e Souza, decano do Instituto de Física da UFF, defendeu a não-remuneração dos chamados bolsistas de produtividade em pesquisa como alternativa para repensar a lógica individualista nos programas de pós: “A bolsa deve ser usada para pagar a participação do professor em congresso, para a compra de material didático. Não deveria ser remuneração”. 

Já a professora Denise Tavares, do Departamento de Comunicação Social da UFF, procurou refletir sobre os critérios usados para avaliação dos profissionais que atuam nos programas de pós-graduação. Ela considerou ser importante verificar os critérios que podem ser positivos e os que estão “desgrudados” na lista de exigências para o pesquisador. “Mensurar é importante”, argumentou. Comparativamente, Denise afirmou que a participação em congresso deve mesmo ter peso menor em relação aos critérios de publicação no exterior, parcerias com outras instituições ou práticas de boa gestão. Segundo a professora, alguns congressos cobram caro pela inscrição e atraem o pesquisador mais pela viagem do que propriamente pelas discussões e troca de experiências acadêmicas.

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