4 de julho de 2012
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André França Rocha Borba
“O meu trabalho possui certas ‘especificidades’ que outros não têm”. “Só eu lido com prazos inadiáveis dos órgãos de fomento”. Esses argumentos, tão comuns no meio acadêmico, procuram justificar a situação dos professores de pós-graduação, que nunca aderem a greves em universidades, como esta que se iniciou em 17 de maio e hoje reúne 95% das instituições federais de ensino, segundo o sindicato nacional dos docentes do ensino superior (Andes). A ideia de que “pós-graduação não faz greve” sugere que, apesar de estarem no mesmo barco, os professores das universidades públicas enfrentam tensões internas que acabam resultando na divisão da categoria.
Este foi um dos temas da palestra que os professores Décio Rocha e Bruno Deus, do Instituto de Letras da Uerj, deram no dia 27 de junho, no Iacs. Eles apontaram o distanciamento entre o trabalho do professor da graduação e o da pós nos últimos anos. Como se um fosse prejudicar o outro em seu direito de luta por melhores condições de trabalho. Como se não fosse uma luta para toda a categoria. A tríade pesquisa, ensino e extensão, fundamental para caracterizar a universidade brasileira até os anos 1980, já não corresponde à realidade dos novos tempos.
“É uma novela quando eu vou participar de algum congresso em outro estado. O Instituto de Letras me libera, mas o Colégio de Aplicação da Uerj me freia”, diz Décio, criticando o que parece ter se tornado “normal” no meio acadêmico: a ideia de que só o professor de ensino superior deve se atualizar, enquanto o graduado do ciclo básico não precisa dessas coisas.
Crítica aos critérios de avaliação
Os dois palestrantes explicaram que a Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) constitui o principal órgão de fomento da pós-graduação stricto sensu em território nacional. Segundo Rocha e Deusdará, essa instituição avalia periodicamente os cursos de pós das federais por uma lógica de recompensa e não de financiamento.
Essas avaliações classificam os cursos com uma nota que abrange de 3 a 7. Qualquer programa de pós recém-criado já recebe a nota 3, que é a mínima. Caso o curso novo não se enquadre nas regras e orientações dadas pela Capes e outros órgãos fiscalizadores, a universidade é obrigada a cancelá-lo.
O curso de pós-graduação avança nas notas quando os requisitos determinados pela Capes são atendidos. Por exemplo, oferecer mini cursos, seminários, palestras, para os alunos da graduação constitui um requisito importante para determinada pós se manter entre as notas 3 e 5. Esse órgão de fomento, inclusive, estimula que os cursos captem recursos financeiros de terceiros, o que também conta para a nota. Premiações, publicações de pós-graduandos, participação em bancas externas também são considerados como requisitos.
Na opinião dos professores Bruno e Décio, o método avaliativo da Capes desvaloriza e desestimula a produtividade. Para se ter uma ideia, um livro com publicações de doutorandos vale menos, em termos de pontuação, que um livro dos doutores e pós-doutores. Ou seja, se o departamento quiser avançar de nota, deve priorizar o trabalho dos seus professores pesquisadores, não de seus alunos. Quando o curso almeja as notas mais altas, 6 e 7, deve, por exemplo, ter como orientandos alunos de outras nacionalidades e a participação de seus docentes – como convidados, diga-se de passagem – em palestras e seminários de cursos de excelência de nível internacional.
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