Protestos virtuais: como sair da tela do computador?

1º de setembro de 2011
Por Elisa Bastos e Fernanda Costantino

A nova onda de protestos virtuais traz inúmeras controvérsias nas novas discussões sobre as redes sociais. Milhares de pessoas usuárias desses meios aderem a campanhas virtuais que, muitas vezes, não saem das telas do computador. O evento do Facebook “#SegurançaUFF” contou com 1.871 presenças confirmadas, no final de agosto desse ano. Esse foi o jeito que alunos da Universidade Federal Fluminense encontraram para reivindicar mais segurança ao redor dos campi da universidade. O movimento os levou ainda a publicar no Twitter a frase “#uffnocqc”, em uma tentativa de chamar a atenção do programa da Band e atrair o foco das mídias para o problema. O tópico ficou em primeiro lugar de circulação no site durante o dia 26 de agosto.


A atenção, portanto, foi conquistada e a campanha ganhou visibilidade, atingindo outros meios de comunicação. O estudante de jornalismo Elson Junior, criador do evento, espera que o protesto alerte as autoridades para a questão. “Quando criamos o Twittaço, nosso objetivo era expor a violência em Niterói, que é um problema que o aluno da UFF e de outras universidades enfrentam todos os dias para cursar sua graduação. Por isso, ganhamos tanto destaque nas redes sociais”.

As campanhas que utilizam o meio virtual como instrumento de difusão de algum movimento, ou simplesmente como concentradora de informação, tornam-se cada vez mais populares. A pesquisa Redes Sociais, lançada no dia 20 de agosto pelo Ibope, mostra que os protestos on-line podem ter um impacto 500 vezes maior do que aquelas que não utilizam esse veículo. Isto porque há um alto grau de relacionamento entre os usuários das redes sociais, que participam de diversas outras campanhas e comunidades, além de portais em que as pessoas deixam suas opiniões acerca do que é debatido.

Uma nova mediação


O sociólogo Paulo Gajanigo, professor da UFF, explica que essa dinâmica representa uma nova mediação das relações sociais. A internet seria, então, um instrumento que promove um teste de novas ferramentas e meios de se manifestar. As limitações e possibilidades, segundo o sociólogo, ainda estão sendo descobertas. Essa modificação das mediações, segundo ele, deriva de um processo de transformações de ideologias, inclusive as ideologias de protesto.

Para Paulo, há uma falsa ideia de oposição entre os movimentos de rua e os virtuais. Algumas pessoas alimentam ilusões de que as manifestações presenciais seriam mais eficazes. A primeira ilusão seria aquela que acredita que é possível mudar o mundo sem tomar o poder, como no caso da internet, através apenas do mundo virtual. “E a outra é achar que a internet é algo muito diferente do que é o mundo real. O que é uma manifestação de rua? É uma demonstração de apoio e a internet também pode ser essa demonstração. A manifestação de rua é também uma preparação para algo, ela não é o poder em si. As duas têm proximidades. O panfleto é mais eficaz que o email? Existe uma espécie de fetiche em relação à rua”, conclui o professor.

A internet, ainda de acordo com a avaliação do sociólogo, facilita o acesso à informação e impede, de certa forma, o esvaziamento de alguns desdobramentos, pois funciona como um banco de dados. Paulo explica que, por outro lado, as notícias somem com grande rapidez, mas existe no contexto dos protestos virtuais uma formação de consciência entre seus usuários.

 

A dúvida sobre a eficácia das manifestações virtuais

No entanto, há quem questione a eficácia dos movimentos organizados nas redes sociais, principalmente aqueles que se restringem a esse meio. Os estudantes de cinema da UFF Mayara Del Bem Guarino e Leandro Calixto usam as redes sociais apenas como um meio informativo e de comunicação, mas não acreditam na completa validade dessas campanhas. Segundo eles, as mobilizações on line são válidas até certo ponto, pois promovem uma discussão, mas não motivam a buscar soluções de fato, o que gera uma maior acomodação. “As pessoas aderem aos protestos e não passa disso”, disse Mayara. Para eles, os protestos de fato são os que se realizam na rua, onde as pessoas “dão a cara a tapa”, como disse Leandro.

Já os estudantes Simone Santos e Leandro Carmo acreditam que a acomodação das pessoas que consideram suficiente o protesto virtual é o que prevalece nessas campanhas em redes sociais. “Eu recebo muitos convites para participar de protestos virtuais. A maioria dos movimentos que aceito fazer parte, eu não participaria se fosse fora da internet. Por isso, acho que desempenho um importante papel quando participo desses protestos. E acho que a visibilidade é muito maior do que se fosse um movimento de rua apenas, porque consegue chamar mais atenção e trazer mais pessoas para também fazerem sua parte. Acho que a pessoa que não pode participar das campanhas de rua e participa pela internet contribui de forma suficiente”, disse Leandro.

As campanhas falsas


Há ainda algumas campanhas e protestos on-line falsos, a exemplo da campanha “Cala a Boca, Galvão”, que surgiu durante a Copa do Mundo de 2010, em referência ao narrador esportivo da Rede Globo, Galvão Bueno. Um grupo de pessoas começou a divulgar na internet a frase, que em poucos dias se tornou o assunto mais comentado do momento. A partir disso, surgiu uma falsa campanha para salvar da extinção uma ave que não existe, o galvão. Os usuários deveriam escrever a frase e, para cada frase escrita, o “Instituto Galvão” ganharia dez centavos. A campanha ganhou o mundo e muitas pessoas aderiram a ela sem saber a veracidade dos fatos. A dimensão foi tanta que este se tornou o tópico mais comentado naquele ano, ganhando os jornais, como o El País, da Espanha, e o New York Times, dos Estados Unidos.

Sobre estas controvérsias, o estudante Elson Junior acredita que a rede é muito mal utilizada. “Boa parte do que é postado acaba virando motivo de piada. Mas há casos que trazem reivindicações justas à web, como a lei da Ficha Limpa e o protesto contra o aumento das passagens de ônibus em Teresina”. Sobre os protestos fora das redes sociais, Elson diz que são válidos, mas que é preciso separar protesto de vandalismo. “Apoio um grupo de estudantes que ocupa a reitoria buscando diálogo com o reitor. Entretanto, não concordo quando os estudantes danificam a placa da Prefeitura. As atitudes devem ser bem pensadas para não abrir brechas para má interpretação”.

Elson acrescenta, ainda, que muitos protestos fora das redes sociais não possuem grande adesão porque as pessoas não têm tempo, o que seria uma vantagem da internet. “Se o problema não for resolvido com a mobilização on line e precisar de um maior engajamento, creio que o mais correto é a mobilização nas ruas. Tudo depende do problema que se debate”.

Um relato de outros tempos


Ao estabelecer uma comparação entre os protestos e campanhas que não utilizavam a internet com as mobilizações que a utilizam, o professor de Letras Jorge de Souza Araujo afirma que as novas tecnologias imprimem velocidade e extensão impensáveis em décadas anteriores. “Talvez o idealismo não seja equivalente, mas permanece a nortear comportamentos louváveis”. Para Jorge, alguns usuários de protestos via internet podem não ter um profundo envolvimento com a causa e podem chegar até a ser manipulados por instituições de poder, mesmo assim o professor acredita que essas manifestações são válidas e trazem certos benefícios.

Jorge participou de movimentos contra a ditadura militar brasileira e foi líder estudantil durante esse período. Ele conta que os movimentos dessa época, sem o uso da internet, tinham as suas limitações de comunicação, ainda mais em tempos de ditadura. As mobilizações eram organizadas através e a partir de contatos e manifestações públicas, como passeatas, comícios, veiculações de notícias em jornal e rádio. “Na medida da eficácia e alcance públicos, os resultados atingiam os objetivos. A luta pela liberdade não se deve restringir nunca a modelos fixos. Compreende a percepção de que o mundo social deve ser organizado para incluir todos os humanos em bem-estar e felicidade”.

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