No morro vizinho ao Iacs, um relato que nunca foi levado em conta

25 de agosto de 2010
Por Evandro Pereira

“Tenho medo, sim. Medo de que aconteça algo comigo, com minha família. Ninguém gosta de ter uma arma apontada em sua direção. Todos aqui se sentem inseguros. Só queremos paz.”
O relato é de Paulo Rodrigues.

Paulo não foi vítima de assalto. Não mora em Icaraí. Seus filhos não estudam no Colégio São Vicente ou na UFF.

Paulo nunca foi ouvido por um repórter.



Ele diz que tem medo por causa da sensação que experimentou quando, em maio deste ano, após a morte de um jovem na praça Leoni Ramos, policiais o pararam no acesso ao Morro do 94, na rua Lara Vilela. Canos em riste, um deles mirando o rosto. Os policiais buscavam traficantes do Comando Vermelho que supostamente seriam os responsáveis pela morte do adolescente, morador do Morro do Palácio, onde o tráfico é dominado por uma facção rival ao CV, a ADA.

Polícia para quem tem... dinheiro


“Quem tem dinheiro reclama, mas a situação não é melhor aqui, não. Quem mora no 94 não pode passar no Palácio, e vice-versa. Quem tem (fricciona o polegar e o indicador da mão esquerda) pode chamar a polícia. E nós? Para a polícia, morador de comunidade é bandido”.

Longe dos boletins de ocorrência e dos microfones, Paulo dá entrevista na entrada do 94, no mesmo lugar onde foi interpelado pelos agentes da lei. O tráfego no pé do morro não pára. O tráfico, no alto do morro, também não. Paulo gesticula, esbraveja, cospe enquanto fala e cresce em suas proporções. Duas crianças, que aparentam idade entre 5 e 7 anos, alinham-se em fila indiana atrás dele. Imitam-no, como mímicos, e riem. Paulo se dá conta e pergunta o que querem, rindo também.

A menina antecipa-se ao irmão, o menor dos dois, e diz: “A gente quer reclamar também!”

Mais risos.

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