Carlos Nelson Coutinho: a vitória da “pequena política”

24 de outubro de 2010

Campanhas eleitorais deveriam ser um momento fundamental para a conscientização e o esclarecimento do público, mas acabam se tornando apenas um jogo de contabilidade estrita e absolutamente pragmática, porque o que importa é vencer, mesmo que às custas da ignorância – mais ainda: do aprofundamento da ignorância – da massa de eleitores.

O apelo à religião e a exploração emocional do tema do aborto, na reta final do primeiro turno e nos dias imediatamente seguintes à proclamação do resultado, são um exemplo evidente dessa lógica, que revela a vitória da “pequena política”.

O professor Carlos Nelson Coutinho tratou dessa questão em artigo recentemente publicado no livro Hegemonia às avessas:

“Existe hegemonia da pequena política quando a política deixa de ser pensada como arena de luta por diferentes propostas de sociedade e passa, portanto, a ser vista como um terreno alheio à vida cotidiana dos indivíduos, como simples administração do existente. A apatia torna-se assim não só um fenômeno de massa, mas é também teorizada como um fator positivo para a conservação da ‘democracia’ pelos teóricos que condenam o ‘excesso de demandas’ como gerador de desequilíbrio fiscal e, consequentemente, de instabilidade social”.

Porém...

“...é expressão de grande política reduzir tudo à pequena política. Em outras palavras, é por meio desse tipo de redução que se desvaloriza a política enquanto tal que se afirma hoje a quase incontestada hegemonia das classes dominantes. Em situações ‘normais’, a direita já não precisa da coerção para dominar: impõe-se através desse consenso passivo, expresso entre outras coisas em eleições (com taxa de abstenção cada vez maior), nas quais nada de substantivo está posto em questão”.

(Carlos Nelson Coutinho, “A hegemonia da pequena política”, em Hegemonia às avessas, organizado por Francisco de Oliveira, Ruy Braga e Cibele Rizek. São Paulo, Boitempo, 2010, p. 32)

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