A violência da Guarda contra o “Garçom do Sinal”

19 de maio de 2012
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Por Sylvia Moretzsohn


Quem passava por aquela curva perto da Praça do Russel, na Glória, sempre via o ambulante espirituoso, fantasiado de garçom, equilibrando uma bandeja para vender água e refrigerante quando o sinal fechava. Circulava pelos carros, puxava conversa com os motoristas de ônibus, contava e ouvia piadas. Era desses personagens populares típicos da cidade, um dos inúmeros paraíbas que driblam a dureza da vida com criatividade, irreverência e bom humor e vão fazendo seus malabarismos para sobreviver. Há 21 anos estava ali.

Até que um dia a Guarda Municipal da cidade olímpica do choque de ordem chega e acaba com a festa.



Na manhã desta sexta, 18 de maio, três guardas municipais abordaram o ambulante, que resistiu e foi agredido. Apreenderam a mercadoria, apesar da apresentação da nota fiscal. “Ele está irregular”, alegou um dos guardas.

Irregular como Cavendish, quem sabe?

Não, os guardas provavelmente nunca ouviram falar em Cavendish, o empreiteiro amigo do governador e de secretários zelosos por contêineres de pronto-socorro e negligentes com bondinhos sucateados, meninos travessos a posar sem-cerimônia com guardanapos na cabeça nas alegres noites de Paris.


Cavendish, o que escapou do acidente fatal de helicóptero na viagem para uma festa de aniversário num resort baiano da qual seu parceiro governador também era convidado, é aquele que não se interessa pela “arraia-miúda” na hora de cultivar seus contatos na política.

Hoje está à beira de ser convocado pela CPI do Cachoeira, aquela do “você é nosso e nós somos teu”.

Nas altas rodas os amigos se protegem. Já da arraia-miúda cuidam os guardas, que extrapolam à vontade, investidos de autoridade com seus cassetetes psicanaliticamente óbvios.

Ao “garçom do sinal” só restou protestar, chorar de raiva, catar as moedas entre o gelo espalhado pelo chão, depois que lhe levaram – irregularmente – a mercadoria, e amargar o prejuízo.


E se não fosse a câmera providencial de um jornalista a gravar a cena, não haveria documento dessa injustiça. 

 
O jornalista Marcio Motta tem vários vídeos postados no YouTube, alguns deles denunciando os excessos da Guarda Municipal, como este, contra um suposto camelô no Centro do Rio. Há comentários indignados com a violência, mas outros que propõem atacar quem documenta a cena. Para esses, a ditadura não acabou.

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